segunda-feira, 26 de julho de 2010

Treino para o corpo e para o espírito




Há uma imagem clássica que surge na mente sempre que a palavra ioga é pronunciada: de olhos fechados, com um semblante de quem alcançou um novo patamar de percepção, surge um ser humano em posição de lótus, sentado com as pernas entrelaçadas sem aparente dificuldade e mãos levemente posicionadas nos joelhos. Não deixa de ser uma imagem correta, mas faz bem pouco jus a tudo que essa prática milenar pode oferecer.


A impressão equivocada é reforçada pelos milhares de anúncios de nirvanas de boutique que circulam por aí. Para evitar confusões, é útil se familiarizar com o assunto.


– Toda prática de ioga busca o autoconhecimento. Antes os professores apontavam para os benefícios físicos apenas. Geralmente isso acontece, mas esse não é o objetivo – explica o instrutor Ricardo Sousa, que leciona o hatha yoga.


Apesar das centenas de estilos catalogados — Ricardo diz que existem cerca de 400 —, todos eles levam à mesma direção: equilíbrio entre corpo e mente.


Como as várias modalidades trabalham com posições idênticas, a escolha depende do que o aluno espera alcançar.


– Geralmente as posições são iguais. O que vai mudar é a abordagem que cada professor dá à prática que leciona – garante Helton Alves de Azevedo, instrutor de hatha yoga.


E, é bom lembrar, cada indivíduo reage de forma diferente aos estímulos.


Os neófitos não devem se assustar com as numerosas ramificações, afinal, ioga é prática. Mas convém saber qual filosofia está na base dos exercícios. Como uma árvore, a ioga se expande a partir de quatro raízes — duas consideradas teóricas (o sámkhya e o vêdánta) e as chamadas comportamentais (o tantra e o brahmáchárya).


– O aluno deve saber que a escola em que ele se matricula já detém um direcionamento a partir dessas filosofias – esclarece Ricardo Sousa.


É a mistura dessas matrizes que moldará o estilo de cada centro de estudos.


O sámkhya é naturalista, ou seja, interpreta os fenômenos da ioga como parte da natureza, sem méritos de divindades.


– Como essa teoria é especulativa, muitos sentem a falta do misticismo, que existe no vêdánta, que é a raiz mais espirtualista – diz Helton Azevedo.


Essa crê no divino como explicação última do universo.


Segundo os instrutores Ricardo e Helton, são essas as duas raízes que fazem a diferença entre aulas mais focadas no esforço físico e aquelas em que a devoção é evidente. Já entre as linhas comportamentais, destaca-se o tantra. Pautado pelo matriarcalismo e pela sensorialidade, ele reserva à mulher um papel privilegiado na cadeia familiar, cultivando a sexualidade plena, sem culpa ou malícia. O brahmáchárya, seu oposto, não admite que o poder seja centrado no feminino nem aceita o prazer, a liberdade e a sexualidade como forma de iluminação.


Filosofias complementares


As chamadas raízes da ioga (que significa “poder”, em sânscrito) correspondem a verbos fundadores. Sámkhya é saber; vêdánta é crer; tantra, sentir e brahmáchárya, dominar. A ioga é puramente técnica, o veículo dessas filosofias. Assim, cada instrutor pode lançar mão de uma “qualidade” diferente de ação para direcionar os ensinamentos.


O cruzamento das raízes dá origem aos troncos: tantra-sámkhya, brahmáchárya-sámkhya, brahmáchárya-vêdánta e tantra-bêdánta.


– O autoconhecimento se manifesta por meio da técnica que será empregada. Por isso, a escolha deve ser bem pensada – adverte o instrutor Ricardo Sousa.


A partir desses troncos florescem as modalidades da ioga, cujos ramos principais são oito. Cada um enfatiza diferentes aprendizados e implica em estilos de vida para o seguidor.


– O aluno deve conversar com o instrutor sobre qual objetivo pretende alcançar e, a partir daí, saber qual modalidade é melhor para ele – explica Felipe Alves, especialista em iogaterapia.


Bem-estar sem restrições


A ioga também é democrática e, por deter tantas ramificações, consegue atender aos iniciantes e avançados de forma satisfatória. Felipe Alves garante que é comum agregar em suas aulas praticantes que acabaram de começar com outros que já estão na ioga há muito tempo.


– Tenho jovens e idosos na mesma turma e eles conseguem alcançar suas metas.


Ele é professor de iogaterapia, que agrega conceitos filosóficos de linhas diversas, como hatha yoga e karma yoga, e diz que, apesar das técnicas, a ioga é um processo muito adaptativo, que permite a participação de pessoas com perfis físicos variados.


As modalidades principais e suas indicações


:: Ashtanga yoga


O método interliga posturas em um fluxo contínuo de movimento e respiração, que é a espinha do ashtanga yoga. Por meio do respirar, o praticante consegue interiorizar a atenção e aquieta a atividade mental, em direção a mais tranquilidade e pacifismo.


:: Hatha yoga


Essa modalidade é origem de muitas outras e, apesar de ter o condicionamento físico com um dos principais meios de obtenção do autoconhecimento, não se retringe a ele. A prática melhora o condicionamento, a força e a flexibilidade, além de ajudar na capacidade de concentração.


:: Kundalini yoga


A chamada ioga da consciência tem práticas que fortalecem, alongam e relaxam a musculatura e todo metabolismo. Ajuda no aumento da capacidade respiratória e estimula uma harmonia entre os sistemas nervoso e glandular, em sintonia com os chakras. Acredita-se que seu propósito terapêutico ajuda a curar o corpo rapidamente, ao estimular o sistema imunológico e abrir os centros que regem a mente e o espírito.


:: Yoga clássico


A prática se vale de uma vivência baseada em princípios de comportamento que envolvem o social, práticas de controle do corpo, energia pessoal e da mente, visando a liberdade, respeito a vida e o convívio em harmonia com tudo o que está ao redor.


:: Yoga pré-clássico


Baseado em estudos arcaicos da ioga, tem nos ensinamentos sensoriais tântricos a sua base. Pretende desenvolver o autoconhecimento através da consciência corporal, em uma integração entre a harmonia de corpo, mente, coração e alma.


:: Power yoga


Ramificação do hatha yoga, mistura movimentos fortes com respiração dinâmica, combinando posições da ioga com exercícios físicos.


Os praticantes são aqueles que buscam treinos mais intensos, aumentando a força, a resistência e a flexibilidade.

Zero Hora 25/07/10



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